Das Galerias.(parteII)  
Nos papéis em meio às asas encontrei a letra de uma criança, provavelmente uma menina, ainda não sei se entendi direito, agachei perante o monte, espalhei um pouco das folhas ao meu redor, a tocha iluminava um recinto científico, cheirando a ácidos e combustões cítricas, eu li nos papeis amarelados uma evocação de lembranças, enquanto seguia meus olhos por cada letra sentia como se um corpo de criança se formava a minha frente, e eu atendi ao chamado, fui com meu peito na impressão até o fundo e uma menina nasceu translúcida e nua diante de mim, era pequena como um jarro de plantas, e cheia de massas, ela tocou meu rosto com delicadeza, seus dedos azúis translúcidos acariciavam minha face, e ela mostou seus olhos e eram de um negro profundo, lá dentro uma galáxia parecia girar, seguiu-se seus lábios a abrirem devagar e disseram: "Não morra com tuas estrelas, muito menos só contemplando."

Então ela me soprou e uma verdade ventilou-se dentro de mim com a sutileza de uma estrela em movimento nós céus admirados, ainda que com a força de mil galáxias em viagem, assim vi a inocência seguir, distante, e morrer sozinha na contemplação de si mesma, sugerindo como um anjo falido que as bordas azúis de nossos diamantes-sonhos, desfazem-se como açúcares minúsculos no oceano escuro onde se dissolve qualquer constelação e meus tempos.


E fui, deixando o laboratório para trás, há uma porta com um "N" imenso como próxima possibilidade, devo por ela entrar?
16:13





  Das Galerias.(parte I)  
Resolvi descer às dependências de meu passado, abaixo de uma montanha imensa de esperança, haviam tantos corredores para desvendar que não posso relatar todos os detalhes por aqui. Preciso escrever, e rápido, pois há um monstro me perseguindo, ele é um vulto entre as pilastras, ameaça-me com sua presença, mas estranhamente não me toca, é o tempo, eu tenho dele feridas, acho que é o medo, eu preciso ir, depois nos falamos, há fogo ainda na minha tocha, sei que encontrarei o que busco, avisto um monte de asas de borboleta, que coisa estranha, o salão parece um imenso laboratório, e há folhas de papel escrito à mão alguma coisa, estão entre as asas, mais de um metro e meio de muitas asas, o que significa?
20:52





  Borboletas de Pedra  
Farão mortos os sonhos, enquanto navegam pelos mares celestes, uma frota de nuvens tristes, clamando o retorno da água, da vida, da virtude, dos pássaros límpidos, das Monarcas, e vão-se cinzas, feitas de brasas, como feridas, a pedir socorro aos corações indignados com a alegria prometida, porém morta ao nascer da lua.

Eu plantaria flores no caminho singrado por esses barcos, mas olhar para a carta naútica de minhas passagens não me mostra outros campos para se dizer oceanos, eu entendo o berço das flores como o solo dos sonhos, e mergulharia nesse chão, nesse prado infinito se não fosse já cerceado, para que dentro fossem encontradas e sepultadas cada uma das esperanças animadas, sóis apagados, e agora só vejo as lápides lendárias, sim, lendárias, como se fossem asas de borboletas de mármores epitáfiadas.
06:35





  Climax e Retrocesso  
Para que a medida entre nós seja estabelecida eu confio o convenção de todos os nossos pedidos, de nossas promessas e de nossos ombros, para estabelecer-se as fórmulas para entendimento das purezas eu lhe sugiro os gamas e gradientes do sol no seu rosto, do brilho em meus olhos e das fotos só nossas, antes que peça a mim a tábua de todos os anagramas possíveis do nosso dia-a-dia, atribua a tua requisição os valores de cada universo que escolhi para nós, como se todos os destinos tivessem-me sido apresentados num portifólio genuíno, e que, em fichinhas brancas ao fundo de cada folha da pasta, tivessem os nomes das realidades cabíveis entre nós e para nós, ponha então esse entendimento na sua questão, ao final do processo entregue as planilhas do tempo para saber se durante nosso beijo, por conta de nosso passado, há entre nós e nos sonhos somados, o climax ou o retrocesso de dois seres amados.
22:04





  Na ponta da Chama  
Principiado o fogo no candeeiro de pedra o alquimista procurou a colher com o borato, trouxe até a chama e deixou bolhas surgirem no sal, os cristais brancos se tornaram um líquido graxento e negro, o fogo ardeu profundamente as estruturas brancas do composto, e culminou numa fumaça perfumosa, fazendo o ocultista sonhar com estrelas no quarto escuro de seus secretos experimentos, à semelhança de Deus inventando a paixão.
20:02





  12 Dias  
Prometi fazer cálculos para avaliar o passado, para entender o presente e planejar o futuro, a aritmética foi simples, contei nos meus dedos os dias desde o aniversário - que fora o fim - e cheguei ao número 12, um valor cabalístico, o dia do meu aniversário, dia do mês do meu aniversário, e o tempo certo para dizer que está tudo em começo ou recomeço, porque tudo que se inicia, em 12 é finalizado, ou então assim principiado.
10:46





  No Ir e Vir  
Estradas de ferro nascidas nos sonhos, eu vos acordo em pesadelos, para te encontrarem idas em mim, perdidas assim, eu vos imploro, tragam de novo meu jardim, elevados campos celestes deitem aqui, para passarem as avenidas de outros tempos, como se retornassem alegres das guerras de temperamentos, eu perdi o caminho quando vi você distante, te acho no horizonte, não te perco um instante, devolva-me a calçada, ou a beira-rio desse leito constante, passe por mim, indo e vindo como um caminhante, não pare, avante, ou então se ficar me alcance, estou aqui contigo, e enquanto você aí sem mim. Eu moro no sonho onde as ruas dão todas em ti, ou porque não precisamos fugir, se houver que andar que seja para se encontrar, abraçar e consertar essas vias que te levaram assim.
10:47





  Menos a Sério  
Eu descobri em Roma que a vida não é tão imperiosa quanto às baladas de muitos exércitos, eu fui achar no irmão filho da loba, que existe um mundo inteiro para abandonar se quisermos o leite, eu quero te agradecer por me fazer assim nascer, eu me amarei enquanto for levando tudo menos a sério, e deixar que o valor dos desvalores sejam para simplificar os limites, a ponto de nos fazer avançar a glória do Império, até lá, obrigado por ser assim meu irmão, quando eu pensei que perdera o único, tão errado como achar que tudo isso é mais que uma boba ilusão.
19:07





  Dia de Defuntos  
Sob a sepultura fria das cortinadas nuvens de horizonte a horizonte, eu silencio a agonizante meninice que fervia meu sangue até ontem.

Esse é um proclame de obituários, pois foi-se com a cor da manhã os meus mais efusivos discursos sobre a beleza da inocência, e sobre seus jardins em mim, sobrando agora os canteiros tristes de velas derretidas falando com os anjos que não resistiram à chama da esperança, e retornam ao escorrido e seco mundo dos sem vida, para assistir as pancadas absurdas que eu dei de dentro dos caixões, para cada valor velado.

Eu deito nessa cova rasa - colchões das últimas súplicas - o cadáver da minha fidelidade, do meu sonho em ressucitar minhas oportunidades finadas em podres carnes da procrastinação, ah! Eu peço a Deus, como quem ajoelha à frente da lápide, para devolver-me o sol nesse dia, diante de mim a luz de novos jardins, e de novas bravuras, para com o sorriso eu resgate meu amigo e meu amor, acendendo as correntes de mil velas, para encontrar o caminho de volta, seguindo o fogo que se concentra todo dentro de uma só capela, essa minha vontade de te ver de novo, e fazer que cemitérios não mais existam entre todos que tiveram o dom de por tudo morrer.

Mas escuto dEle Sua ladainha de tristezas iguais, pois-se Ele a olhar para o chão e ver a solidão vingar nos campos de parafina, esses mares de ingratidão e cores de nublados tempos, chorando todos, a angústia das pancadas nos ataúdes cardíacos, enquanto cismam-se de que a vitória não é mais possível, encantam anjos com a melancolia de lágrimas imortais pedintes de serem ascendentes,para suprir Deus como uma chuva ao contrário, da água que mostra em nós não termos mais vida, a dizer que estamos aqui procurando num labirinto sem fim, corredores de vermes truncados das lápides morais, tentando uma saída ao resplendor de seu abraço, do meu abraço, do nosso abraço.

Ah! Deus que me colocou aqui! Dou-te à seu epitáfio as flores de pétalas eternas, essas minhas desmedidas feridas, com toda a cor, permanêcia e secura das Sempre-Vivas.
10:38